sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

PT trata os potenciais aliados Kassab e Fruet como “cães tolerados pela gerência”. Ou: Aqui está a razão de o Brasil ser um país rico com um povo ainda muito pobre


Vejam o post abaixo, em que petistas batem a cabeça por causa da eventual aliança com Gilberto Kassab, do PSD. Ali vai resumida uma boa parte dos desacertos do Brasil. A senadora Marta Suplicy (PT-SP) era o que se pode chamar de “candidata natural” do PT ao cargo. O que é um “candidato natural”? É aquele que representa a vontade da maioria do partido na esfera da disputa (nacional, estadual ou federal), que tem uma aceitação ao menos razoável do eleitorado (era o caso) e que tem experiência para o cargo (e Marta tem, o que não quer dizer gostar de suas opções). Minha simpatia por ela é negativa, abaixo de zero. Mas era a candidata natural. Ponto. Veio Lula e deu o dedaço: “Será Haddad”. Como o nome da “democracia interna” do PT é Lula, o candidato é o ex-ministro da Educação.
Os petistas, vocês sabem, são treinados para infernizar a vida dos adversários e para sabotar mesmo a sua administração. Mas também têm experiência em engolir brasa. Marta engoliu mais ou menos. Há dias, escreveu um artigo na Folha, um pouco em martês, um pouco em psicologês, sobre o ressentimento e a necessidade de superá-lo… Entendi. Ela ainda não superou.
Os petistas plantaram na imprensa que ela ainda não entrou na campanha, uma forma de tornar público o descontentamento com a sua atuação. Depois de esmagada por Lula, que foi lhe minando os apoios, querem-na agora disciplinada, fazendo campanha para aquele que tentou roubar dela até os CEUs — Haddad anda sugerindo que foi ele quem viabilizou a idéia. Até quando petista bate a carteira de petista trata-se de bateção de carteira, né? Eles não têm limites, todos sabem.
Muito bem! Uma ala considerável da direção do PT, a começar de Lula, quer a aliança com Gilberto Kassab. Todos os envolvidos nessa conversa devem saber por quê. Marta, pelo visto, considera difícil a composição. Compreendem-se com clareza os motivos objetivos: na esfera municipal, foram ela e sua turma que comandaram a operação de desgaste da gestão Kassab. Como justificar a aliança? Terão de subir no mesmo palanque, não? Atenção! Eu estou entre aqueles que acham a gestão de Kassab muito melhor do que a opinião que se consolidou a respeito dela, mas eu não sou petista, certo?
À sua maneira, nesse imbróglio, certamente discordando da opinião que Marta tem da administração de Kassab, ela me parece aquela que conserva ainda alguma coerência. Considero a aproximação de Kassab com o PT uma mudança de rumo, de lado ou o que quiserem. Não foi o eleitorado petista que lhe deu o mandato da maior cidade do país. Ao contrário: este o queria longe da Prefeitura. E os petistas lhe deram combate duro ao longo de seis anos.
Vejam o que diz o Jilmar Tatto, ex-secretário de Marta e novo líder da Câmara, agora discordando da antiga chefe:
“Se o Kassab fizer uma autocrítica, não vejo problema na aliança. Acho um pressuposto muito ruim a idéia de recusar apoio”.ENTENDERAM? SEGUNDO TATTO, OS PETISTAS NÃO PRECISAM EXPLICAR A ALIANÇA COM KASSAB. É KASSAB QUEM TEM DE PEDIR DESCULPAS POR SEU PASSADO, CONFESSAR QUE ANDOU ERRADO, QUE ESTAVA NO MAU CAMINHO E QUE AGORA DESCOBRIU A VEREDA DA VIRTUDE. Segundo Tatto, Kassab pode se juntar àquela gente boa do PT desde que renegue a sua história. Aí, então, ele passa a ser defendido pelo partido. Que tal este texto: “Serra nunca foi meu pastor. Meu pastor é Lula!”
 Não foi, então, assim que o petismo passou a abraçar notórios inimigos? Já postei aqui dois vídeos com dois Lulas: um em que o Apedeuta trata Roseana Sarney e seu pai aos pontapés e outro em que a cobre de elogios, transformando-a em heroína.
Para os petistas, em suma, o único defeito que um político pode ter é não se subordinar ao petismo. Não é por acaso que Lula seja aliado hoje de Fernando Collor e do próprio Sarney, mas continue a hostilizar FHC. Certamente não é o critério moral que conta, certo?
Caso a aliança saia mesmo, não vejo a hora de ouvir Kassab fazendo seu ato de contrição e seu batismo de fogo, sendo considerado, então, um neoconvertido. Vamos ver as más companhias do passado que ele terá de conjurar e com quem estará de braços dados. O ato poderia ocorrer naquela região de São Paulo chamada Tattolândia. Ou naquele terreno que vai abrigar o “Memorial da Democracia”…
Finalmente, FruetA indignidade petista é de tal sorte que o deputado André Vargas (PT-PR) defendeu assim, para a banda paulistana do partido, a união do seu partido com o atual prefeito:
“É isso mesmo. Em Curitiba, nós fazemos aliança com Fruet e, em São Paulo, vocês aceitam Kassab”.Vamos ver se deixo claro por que é um procedimento nojento. Fruet é um ex-tucano. Desentendeu-se com o grupo do governador Beto Richa e deixou o partido, migrando para PDT, que pertence à base do governo. Disputará a Prefeitura de Curitiba com o apoio petista. O que Vargas quer dizer é o seguinte:
“Eu sei que vocês, petistas paulistanos, desprezam Kassab; nós também desprezamos Fruet. Mas, assim como vamos apoiá-lo aqui, aceitem o apoio do outro lá. Afinal, o nosso único interesse é derrotar tucanos. E, para isso, vale tudo”.
Atenção! Eu não acho que a aliança de Kassab ou Fruet com o PT conspurque a moralidade petista porque penso que aliança nenhuma seria capaz de fazê-lo. Se alguém pode ter a honra manchada aí, certamente não serão os petistas, se é que me entendem…
Ocorre que os próprios petistas tratam os possíveis aliados como uma gente nojenta, que se tolera por questões meramente táticas, cuja presença incomoda, ainda que possa ser eventualmente necessária. Se curitibano, eu jamais votaria em Fruet, mesmo não tendo, até agora, nada contra ele. Ao contrário: sempre me pareceu um parlamentar correto. Se vai se juntar com petistas, bem, isso significa admitir um método — método que rejeito absolutamente. Se ele e Kassab não se importam em ser tratados pelos petistas como “cães tolerados pela gerência”, para usar uma imagem de Fernando Pessoa, não serei eu a me importar por eles; que se virem com sua própria reputação.
Logo, não escrevo este texto para que ambos mudem idéia. Sigam firmes no seu propósito, e que o eleitorado lhes seja leve. Eu escrevo este texto para evidenciar que esse tipo de procedimento, de todos os envolvidos nessa mistura, é o melhor retrato dos desacertos do Brasil. Isso explica em boa parte por que, com efeito, temos um país rico com um povo ainda muito pobre.
Eis a política vivendo o seu estado de miséria.
Por Reinaldo Azevedo

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