quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Dilma e o fetiche mentiroso e autoritário da “cadeia que fortalece a têmpera”. Ou: Por que mesmo ela nomeou a nova ministra das Mulheres?



Pois é… Como costumo dizer aqui, eu lido com fatos, não com mitos, conversa mole, torcida, essas coisas. Nunca me encantaram, por exemplo, as sete demissões dos ministros acusados de corrupção por uma razão simples: quem demitiu também nomeou. O que me interessa é o modo como essa gente entende o poder. “Ah, mas não demitir teria sido pior…” Sim: sempre é possível ser pior. Não costumo eleger temas para meu entusiasmo na bacia das almas.
Goste eu ou não das coisas que diz Dilma Rousseff, eu a levo a sério, ora essa. Afinal, é presidente da República. Não foi com o meu voto, mas foi com o da maioria dos que participaram do pleito. E eu levo em consideração a voz institucional da Presidência. Por isso, transcrevo trecho do seu discurso por ocasião da posse de Eleonora Menicucci no Ministério das Mulheres. Leiam (segue em vermelho, com alguns destaques):
(…)
A Eleonora, eu conheço há muito tempo. Ao longo dessa semana, muitas vezes, eu ouvi uma discussão a respeito de por que a Eleonora foi indicada para assumir o cargo de ministra dessa Secretaria de Promoção das Mulheres, desse Ministério que é responsável pela condução da política específica e intersetorial de todas as mulheres. Eu considero que eu escolhi a Eleonora por vários motivos, mas, sobretudo, pelo conjunto da obra.
A Eleonora, sem sombra de dúvida, como muitas das mulheres que no Brasil participaram da luta contra a ditadura, tiveram uma trajetória comigo, mas, ao longo desse processo, ela construiu e reconstruiu a sua vida como cada um de nós teve de fazê-lo. Conquistou seus espaços e foi capaz de desenvolver, sem sombra de dúvida, uma trajetória profissional, uma trajetória de competência e, sem sombra de dúvida também, uma trajetória de compromisso com a luta das mulheres trabalhadoras, de todas as mulheres deste país.
Ela, agora, se afasta por um tempo da Academia, e se afasta de uma carreira dentro das universidades para dedicar-se agora, no Poder Executivo, às criações, às ações e às iniciativas que permitem com que nós transformemos os nossos ideais de igualdade e justiça social em políticas concretas, políticas que alterem o cotidiano, a vida e as oportunidades de milhões e milhões de mulheres e, sobretudo, das mulheres e de seus filhos e filhas.
Ela vem, sem sombra de dúvida, engrandecer o meu governo, e eu tenho absoluta certeza que a Eleonora é capaz de assegurar, dentro da diversidade que é o nosso país, que todas as situações sejam consideradas, porque, quando nós assumimos o governo, nós governamos para todos os brasileiros e brasileiras, sem distinções políticas, religiosas ou de qualquer outra ordem.
Eu compartilho com a Eleonora uma história de luta pela democracia e tenho certeza de que nós muito nos orgulhamos dessa história. Estivemos juntas e compartilhamos no presídio Tiradentes a dura experiência da prisão. Eu posso afirmar a vocês que esses são momentos em que o caráter e a dedicação às convicções e às causas são testados à exaustão. Por isso, eu tenho certeza, que meu governo ganha hoje uma lutadora incansável e inquebrantável pelos direitos das mulheres. Uma feminista que respeitará seus ideais, mas que vai atuar segundo as diretrizes do governo em todos os temas sobre os quais terá atribuição.
(…)
VolteiAcho que já está bom. Se Eleonora foi nomeada pelo “conjunto da obra”, isso inclui a sua militância naquelas ONGs, onde se dedicou àquelas práticas magníficas, descritas com alguns detalhes na entrevista que o governo federal tenta agora esconder. Eu prezo o sentido das palavras. “Conjunto da obra” quer dizer “conjunto da obra”.
Eu não tenho a menor paciência para a empulhação. Dilma deveria ser mais cuidadosa sobre o próprio passado e o de alguns companheiros. Não! Nem Dilma nem Eleonora queriam democracia. Isso não é matéria de gosto ou de viés ideológico. É matéria de fato. Se alguém encontrar algum documento ou fato histórico que evidenciem o compromisso da VAR-Palmares ou do Partido Operário Comunista com a democracia, eu nunca mais escrevo. Mas eu posso encontrar os fatos que evidenciam o compromisso dessas mesmas organizações com a ditadura comunista. Se alguém mente sobre essas questões, é claro que não é este escriba.
Dilma também precisa parar com essa história absurda, mentirosa e, no limite, justificadora do mal e da brutalidade, segundo a qual a cadeia fortalece a têmpera e o caráter dos prisioneiros. Fica parecendo que os que não passaram pela experiência tiveram menos importância na construção da democracia. A verdade — infelizmente para ela, para Eleonora e amigos — está exatamente no oposto: a democracia foi construída por aqueles que lutaram, de modo pacífico, em favor da democracia. As turmas de Dilma e Eleonora queriam, reitero, ditadura. Aliás, contribuíram objetivamente para o endurecimento do regime.
Esse estranho fetiche pela cadeia acaba induzindo uma idéia perversa, senhora presidente! Fica até parecendo que os cárceres do Regime Militar fizeram bem aos detidos: de lá saíram ministros, deputados, senadores, presidente da República… Nem o mais delirante apoiador da ditadura ousaria fazer esse estranho raciocínio, não é mesmo, Excelência? Se alguma razão há nisso, é de outra ordem: das cadeias comunistas, regime que Dilma e Eleonora defendiam, não costumam sair pessoas vivas para disputar eleições. Dias antes, aliás, de a Soberana chegar a Cuba, mais um prisioneiro havia morrido. Sob o silêncio cúmplice da presidente brasileira, que preferiu apontar o dedo para Guantánamo. Ela, sim, agiu movida apenas por ideologia. O compromisso com os direitos humanos foi a última de suas preocupações.
A DEMOCRACIA brasileira, presidente, não foi construída principalmente pela turma da cadeia, não, viu?, mas por aqueles que continuaram, mesmo num aperto danado, empunhando a bandeira da democracia representativa.
Esquerdistas ficam furiosos quando escrevo essas coisas, sei muito bem. Reagem com exclamações, indignações, xingamentos. Só não conseguem responder com fatos. Cadê os fatos que me desmentem? A história tem lá suas ironias, né? Dilma, durante a ditadura, não moveu uma palha pela democracia e se tornou presidente da República. Ulysses Guimarães, herói da redemocratização, não chegou lá. Em 1989, Lula recusou o seu apoio no segundo turno na disputa contra Fernando Collor.
Eles mentem. Eu desminto. Eles não cansam. Eu também não.
Por: Reinaldo Azevedo

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