Guilherme
Fiúza
Nesses tempos de devoção às minorias, não é justo deixar de destacar a contribuição de
Rosemary Noronha para a causa feminina. O Brasil progressista explode de
orgulho por ser governado por uma mulher – que aliás deu a Rosemary sua chance
de brilhar – e não pode agora se esquecer de reverenciar mais uma expoente do
gênero. Assim como Dilma, Rose chegou lá. O fato de estar enrolada com a
polícia é um detalhe.
Rose e Dilma escreveram seus nomes na
história do Brasil por serem, ambas, utensílios de Lula. A finalidade de cada
uma para o ex-presidente não vem ao caso. O que importa é que ambas funcionaram
muito bem. Como se nota pelo ufanismo nacional em torno de Dilma, não se espera
mais da mulher moderna opinião própria, autonomia e iniciativa. Basta botar um
tailleur vermelho, um colar de pérolas e decorar suas falas. E muito
importante: falar o mínimo, para errar pouco. Até outro dia isso era piada
entre Miguel Falabella e Marisa Orth (“cala a boca, Magda!”). Hoje é sinal de
poder.
O grande símbolo feminino brasileiro da
atualidade, que desperta a admiração de Jane Fonda – que tempos! – não tinha
feito nada de extraordinário na vida até ser levada pela mão do padrinho ao topo.
O feminismo realmente mudou muito.
Lá chegando, seu maior mérito foi usar
vestido e não ser o Lula (para os que não suportavam mais o ogro bravateiro),
ou ser o Lula de vestido (para os que seguem venerando o filho do Brasil). Sem
nenhum plano de governo, com um ministério fisiológico de cabo a rabo, sem um
mísero ato de estadista em dois anos de mandato, Dilma se destaca por ser ou
não ser Lula, dependendo do ponto de vista. É a apoteose da nulidade, que o
Brasil progressista e feminista consagra com aprovação recorde.
Diante desses novos valores, seria injusto
não consagrar Rosemary também. A representante da Presidência da República em
São Paulo fez exatamente o que Dilma fez em Brasília: cacifada por Lula, passou
a reger o parasitismo do PT, cuidando da nomeação de companheiros e dando
blindagem política às suas peripécias para sucção do Estado.
No caso de Dilma, a grande orquestra
fisiológica foi desmoronando ao vivo, com nada menos que sete ministros
nomeados (e protegidos até o fim) por ela caindo de podres, graças à ação da
imprensa. A mulher-modelo de Jane Fonda ainda havia parido uma Erenice, a quem
preparava para ser a dama de ferro de seu governo (Jane não pode imaginar o que
seria isso) – derrubada por fazer na Casa Civil algo muito parecido com as
operações fantásticas de Rosemary. Até o uso da Anac como balcão de negócios se
repetiu. Por que só Dilma é ícone feminino, se Rosemary mostrou ser um prodígio
da mesma escola?
Por algum mistério insondável, a Polícia
Federal não fez escutas nos telefones de Rose, ou diz que não fez. As conversas
da mulher que regia uma quadrilha grudada em Lula, se apresentando como sua
namorada, e que tramou até sabotagem ao julgamento do mensalão – o mesmo que
Lula tentara com Gilmar Mendes – não interessou aos investigadores. O ministro
da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que não havia motivos para grampear
Rosemary – uma suspeita que está impedida pela Justiça de sair de sua cidade.
Esses ministros farsescos do PT podiam ao menos ser mais criativos. Mas não precisa,
porque o Brasil engole qualquer coisa.
Marcos Valério disse que Lula teve despesas
pagas pelo esquema do mensalão e autorizou operações bancárias do valerioduto.
É comovente a desimportância atual dessas declarações. Lula é o líder de um
projeto político montado para a permanência no poder a qualquer custo – e essa
fraude está exaustivamente demonstrada pelo mensalão, por Dirceu, Erenice,
Palocci, Pimentel, aloprados, Rosemary e praticamente todo o estado-maior
petista, tanto de Lula quanto de Dilma, flagrados em tráfico de influência para
se aferrar ao poder na marra. O que mais é preciso denunciar?
O eleitor brasileiro está brincando com fogo.
Enquanto o desemprego estiver baixo, vai continuar afiançando a fraude que
finge não ver. O país vai sendo empurrado com a barriga pelos fisiológicos – e
essa conta vai chegar. O governo desistiu de controlar a inflação, que vai se
afastando da meta (apesar da mudança de cálculo que reduziu o índice). A
gastança pública é disfarçada com truques contábeis para esconder o déficit. A
arrecadação brutal banca a farra dos companheiros, sem sobra para investimentos
decentes – e tome literatura de trem-bala e tarifas mentirosas de energia, que
já multiplicam os apagões por manutenção precária.
Como se viu na funesta CPI do Cachoeira, a
mafiosa Delta comandava o planejamento da infraestrutura terrestre.
Mas está tudo bem, e oito governadores podem
ir de cara limpa prestigiar Lula e sua democracia de aluguel. Se este é o país
que queremos, Rosemary é a mulher do ano.